quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Propostas de Manifesto da Assembleia Popular do Porto

“…..enveneno-vos com um texto, que é para ser aberto, completado, graffitado, ou mandado para os quintos!”

“Nem um gesto de paciência: o sonho ao nível de todos os perigos”, António José Forte

Trazemos connosco a vontade de construir outro mundo, onde a emancipação, a autonomia colectiva, a alegria de viver e o sentido crítico, se transformem numa aprendizagem feita a partir da participação livre, numa base horizontal de decisão que a todos pertence e que se nutre da solidariedade e da autonomia.
Se isto não bastar como princípio, temos ainda um rumo: queremos estar onde ainda se sonha. Sonhar é pensar além do capitalismo, é renunciar a pensar com ele, é não nos rendermos ao imaginário miserável que o capitalismo – e as suas lógicas de poder – vende, exporta, expande e coloniza, do Porto a Adis Abeba, do Cairo a Nova Iorque.
Não temos outro exemplo: transformar a nossa vida e fazer outro mundo depende das nossas mãos. Ninguém representa ninguém. Aqueles que abraçarem o mesmo caminho, não serão transformados em espectadores, da vida e do mundo. Ou, melhor, em espectadores da destruição da vida, da destruição do mundo, como se encarrega de fazer a política, a cultura e a media dominantes. De representatividade em representatividade, chegámos a esta fantasmagoria em que actores como o mercado, empresas de rating, especulação financeira, centros de decisão supra-estatais, submetem milhões e milhões de pessoas a uma vida pobre e degradante, no bolso, no corpo, no imaginário, na vida colectiva. A democracia que fazemos e queremos construir não está à venda.
Não se pode ser contra a precariedade, sem ser contra o capitalismo, enquanto perspectiva colectiva, social e política. Quando falamos hoje em capitalismo, não nos referimos apenas a um modelo económico, ele próprio assente em pressupostos precários – precário sob o ponto de vista humano, filosófico, político e económico.
O que é, então, de forma ampla o capitalismo no século XXI? E, para que serve?
Na sua essência, continua a sua senda inexorável: a lógica mais entranhada, culturalmente totalizante e implacável, de desviar a riqueza socialmente gerada por todos para o lucro de uma elite. Mas as estratégias camaleónicas do capitalismo e seus mecanismos romperam, no século que começou, com uma nova componente: além da extorsão de riqueza, por todos gerada para pagar e financiar o lucro privado, agora essa riqueza pública serve para pagar os prejuízos causados pela oligarquia financeira e especuladora, abrigada e protegida pela mole de interesses políticos reinantes, sempre pronta a vender a dignidade humana, a justiça social, a emancipação social, em troca da infâmia do poder que exercem.
Sem querermos tudo abarcar, desta forma de poder chamada capitalismo, resulta: crescente desigualdade social; perda de direitos sociais e laborais, conquistados no passado por processos de luta operária e social; neo-expansionismo à custa das sociedades mais pobres e/ou não-Ocidentais; novos conflitos bélicos, espoletados pela lógica fascizante do império económico-militar; caos ecológico e “escravização” dos recursos naturais; degradação e controlo do imaginário, através do embrutecimento e infantilização da indústria cultural, educativa e mediática; apologia acrítica da tecno-ciência, indispensável quer para o aprofundamento e expansão do mercantilismo, quer para a eficiência dos dispositivos de controlo dos poderes dominantes.
Por tudo isto, “só” somos contra a precariedade, na medida em que não queremos perspectivar a nossa vida e a vida de todos com base nas relações de poder estabelecidas pelo capitalismo: submissão ao poder hierárquico; competição e individualismo; império do patriarcado; domínio do poder autoritário nas organizações onde todos passam a maior parte da vida, da escola ao trabalho, como também nas formas político-oligárquicas que regulam a sociedade, e, cada vez mais, na própria rua e espaço público…
Não andará longe da verdade afirmar que, em nenhum momento histórico, a necessidade de uma transformação total das relações sociais foi tão evidente.
Há quem proteste contra a precariedade do emprego, nós protestamos contra a submissão do trabalho assalariado. Há quem proteste contra os falsos recibos verdes, nós protestamos contra qualquer base de relação exploratória. Resumindo, há quem proteste contra as condições em que se estabelece a submissão, há quem proteste contra a submissão.
A “geração à rasca” perderá o seu tempo e energia se andar a pisar ovos. É que o poder político dominante e a lógica cadavérica do capitalismo sabem fazer gemadas como ninguém.
A vida que desejamos, o pensamento livre e a acção autónoma a que nos propomos, estão bem acima da mínima submissão precária.
Não queremos falar para o ar: propusemos e organizamos esta assembleia popular no Porto (2011), porque estamos aqui e contamos convosco.

Abril 2011                                                                                                        Júlio Vadio


   
   MANIFESTO da/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO

1 – A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO declara/m–se contra todas as formas de TIRANIA,DOMINAÇÃO e EXPLORAÇÃO, sejam do Estado, do Capital Financeiro e do Patronato, seja nacional, regional ou global;
2- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO afirma/m-se como uma forma possível de CONTRA-PODER popular que possa constituir um entrave à continuação por mais tempo da MENTIRA ORGANIZADA em “Razão de Estado”, às falsas promessas dos políticos profissionais, à CORRUPÇÃO, organizadas pelas “máfias” dos “poderosos” dos poderes políticos e do dinheiro;
3- NÃO são objectivos da/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO , nem a TOMADA DO PODER POLÍTICO DO ESTADO , nem a ESTATIZAÇÃO DA ECONOMIA – estatizando mas não socializando o Capital privado e transformando-o em CAPITALISMO DE ESTADO, monopolista ou não  - mas SIM : 1º- o ESVAZIAMENTO do poder do Estado através da acção dos CONTRA-PODERES POPULARES  , 2º- A SOCIALIZAÇÃO e AUTO-GESTÃO DIRECTA das empresas e de todos os meios de produção (fábricas, serviços públicos e a terra das grandes propriedades fundiárias ) pelxs próprixs trabalhadoras/es que nelas trabalham;
4- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO contrapõe/m-se à REPRESENTOCRACIA do Estado e dos APARELHOS POLÍTICOS PARTIDÁRIOS que constituem autênticas FARSAS de “DEMOCRACIA” , que colocam nas mãos de uns/umas quantxs privilegiadxs o poder de decidir em nome da população em geral aquilo em que cabe a todo o povo participar e decidir : a definição dos nossos direitos e deveres uns para com os outros, , a melhoria ou limitação da nossa qualidade de vida, quem deve e quem não deve fazer “sacrifícios” em tempos de “crise”e  a limitação ou alargamento dos nossos “direitos, liberdades e garantias” conquistadas por gerações de trabalhadores e pelo povo com as suas lutas e com o 25 de Abril de 1974;
5- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO, em consequência, opõe/m ao representativismo dos profissionais da política , a autêntica democracia e contra-poder popular, a DEMOCRACIA DIRECTA ASSEMBLEÁRIA, respeitando o direito à diferença das minorias populares discordantes;
6- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO não rejeita/m a necessidade de eleger para tarefas especiais, tanto delegadxs como grupos de trabalho especiais, em actividades, problemas e áreas específicas onde  as necessidades das populações, e sobretudo  dos  seus grupos mais fragilizados, estão postos em causa. Mas tais “delegados” e/ou elementos dos  “grupos de trabalho”deverão aceitar ser revogáveis a todo o momento pela Assembleia Popular, serão voluntárixs e não gozarão de quaisquer privilégios e/ou compensações materiais por isso;
7- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO defende/m  a necessidade de a população trabalhadora, empregada e desempregada (mais necessitada e alvo PRINCIPAL das medidas antisociais dos governos a pretexto de “combater a crise”) se ORGANIZAR  de forma AUTÓNOMA relativamente a quaisquer partidos políticos e órgãos de poder político estatal ou do poder económico (capitalista), coordenando-se com outras assembleias populares que surjam, aos níveis REGIONAL, NACIONAL e INTERNACIONAL, a fim de tornar a sua acção mais justa e eficaz ;
8-A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO, criará/criarão os órgãos organizativos e grupos especiais de voluntárixs que ela/s próprias deliberarem por maioria absoluta, no sentido de estender/em aos vários campos da luta social (lutas de trabalhadoras/es, de moradores, de utentes dos serviços públicos, de imigrantes e minorias étnicas alvos de descriminação, de utilização e ocupação de espaços urbanos e terrenos desocupados, etc.) e às várias localidades, o sistema geral autogestionário das ASSEMBLEIAS POPULARES SOBERANAS;
9- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO rejeita/m a colaboração com quaisquer organismos e pessoas individuais que teórica ou praticamente defendam a exploração capitalista, a dominação do Estado sobre a sociedade, a destruição da Natureza e do ambiente, as discriminações étnicas, o racismo, o sexismo, o nacionalismo, a violência do Estado na protecção dos privilegiados de uma minoria da sociedade contra a maioria da população;


10- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO defende/m , encoraja/m e aplica/m  no seu seio os princípios de APOIO MÚTUO, AUTOGESTÃO, COOPERAÇÃO POPULAR, DESCENTRALIZAÇÃO DA ACÇÃO, IGUALDADE E COMPLEMENTARIEDADE DAS DIFERENÇAS NO MEIO POPULAR, ANTI-CAPITALISMO, ANTI-ELITISMO, ANTIAUTORITARISMO,FEDERALISMO POPULAR;
11- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO declara/m-se portanto contrária/s a quaisquer tentativas de manipulação e corrupção dos seus princípios, objectivos e programas de acção por quaisquer grupos ou partidos políticos , religiões ou grupos económicos capitalistas, opondo-lhes o seu próprio funcionamento como exemplo e alternativa possível  para a construção de uma sociedade humana verdadeiramente LIVRE, SOLIDÁRIA e ECOLÓGICA;
12- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO solidariza/m-se no terreno prático (e não apenas no das meras intenções) com todas as justas lutas populares contra a exploração do Capital e a opressão do Estado,  pela Terra, pela Liberdade, pela Igualdade e pela Dignidade, promovendo e apoiando a RESISTÊNCIA SOCIAL ORGANIZADA e a ACÇÃO DIRECTA POPULAR contra todos os usos e abusos dos “poderes” contra o povo;
13-A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO conta/m com a participação activa e solidária de todos os indivíduos, grupos e colectivos que se identifiquem com os princípios e objectivos deste manifesto;
14- A/s ASSEMBLEIA/s POPULAR/es do PORTO só reconhecem um limite aos desejos e sonhos de LIBERDADE, IGUALDADE e DIGNIDADE dos povos: o Céu! …E mesmo ele, se foi transformado em quinta privada dxs “Poderosos” e privilegiadxs da banca, do Capital em geral e do Estado…TEREMOS DE IR AO ASSALTO DELE! TEREMOS DE IR AO ASSALTO DO CÉU se é cada vez mais o INFERNO da carência, da miséria e da sub-vida o que nos vais cabendo na actual dita “civilização”!
VIVAM AS ASSEMBLEIAS POPULARES!      VIVA A AUTOGESTÃO GENERALIZADA!     VIVA A DIGNIDADE!           

Porto, 7 de Agosto de 2011-08-08

Bandeira Negra 

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